segunda-feira, 11 de abril de 2011

                                             A porta do lado

A PORTA DO LADO
Por Dráuzio Varella

         Em entrevista dada pelo médico Drauzio Varella, disse ele que a gente tem um nível de exigência absurdo em relação à vida, que queremos que absolutamente tudo dê certo, e que, às vezes, por aborrecimentos mínimos, somos capazes de passar um dia inteiro de cara amarrada.

         E aí ele deu um exemplo trivial, que acontece todo dia na vida  da gente...

         É quando um vizinho estaciona o carro muito encostado ao seu na garagem (ou pode ser na vaga do estacionamento do shopping). Em vez de simplesmente entrar pela outra porta, sair com o carro e tratar da sua vida, você bufa, pragueja, esperneia e estraga o que resta do seu dia.

         Eu acho que esta história de dois carros alinhados, impedindo a abertura da porta do motorista, é um bom exemplo do que torna a vida de algumas pessoas melhor, e de outras, pior.

         Tem gente que tem a vida muito parecida com a de seus amigos, mas não entende por que eles parecem ser tão mais felizes.

         Será que nada dá errado pra eles? Dá aos montes. Só que, para eles, entrar pela porta do lado, uma vez ou outra, não faz a menor diferença.

         O que não falta neste mundo é gente que se acha o último biscoito do pacote. Que "audácia" contrariá-los! São aqueles que nunca ouviram falar em saídas de emergência: fincam o pé, compram briga
e não deixam barato.

         Alguém aí falou em complexo de perseguição? Justamente.
O mundo versus eles.

         Eu entro muito pela outra porta, e às vezes saio por ela também.
 É incômodo, tem um freio de mão no meio do caminho, mas é um problema solúvel. E como esse, a maioria dos nossos problemões podem ser resolvidos assim, rapidinho. Basta um telefonema, um e-mail, um pedido de desculpas, um deixar barato.

         Eu ando deixando de graça... Pra ser sincero, vinte e quatro  horas têm sido pouco prá tudo o que eu tenho que fazer, então não vou  perder ainda mais tempo ficando mal-humorado.

         Se eu procurar, vou encontrar dezenas de situações irritantes e  gente idem; pilhas de pessoas que vão atrasar meu dia. Então eu uso a  "porta do lado" e vou tratar do que é importante de fato.

         Eis a chave do mistério, a fórmula da felicidade, o elixir do  bom humor, a razão por que parece que tão pouca coisa na vida dos outros dá errado."

         Quando os desacertos da vida ameaçarem o seu bom humor, não estrague o seu dia... Use a porta do lado e mantenha a sua harmonia.
 Lembre-se, o humor é contagiante - para o bem e para o mal - portanto, sorria, e contagie todos ao seu redor com a sua alegria.
A "Porta do  lado" pode ser uma boa entrada ou uma boa saída... Experimente!
      Tutora: Amirleni
       Gestarf II - Nova Alvorada do Sul -MS
 
                                                           Ladrão de patos



Muitas vezes nos deparamos com textos cujas palavras não nos dizem nada. Por quê?

Uma das respostas possíveis está no fato de  tais palavras não fazerem parte do nosso universo linguístico.

O que fazer então? Recorrer ao dicionário?

Sim, é uma ideia. Mas imagine você tendo que recorrer ao dicionário para saber o significado de cada palavra? O prazer da leitura já era.
Veja o texto a seguir


Diz a lenda que Rui Barbosa, ao chegar em casa, ouviu um barulho estranho vindo do seu quintal. Chegando lá, constatou haver um ladrão tentando levar seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular o muro com seus amados patos, disse-lhe: Oh, bucéfalo anácrono! Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo; mas se é para zombares da minha elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à qüinquagésima potência que o vulgo denomina nada. E o ladrão, confuso, diz:

- 'Dotô, eu levo ou deixo os pato?'



E AINDA HÁ GENTE RECLAMANDO QUE O PORTUGUÊS É DIFICL HOJE KKKKKKK

BJS Diz a lenda que Rui Barbosa, ao chegar em casa, ouviu um barulho estranho vindo do seu quintal. Chegando lá, constatou haver um ladrão tentando levar seus patos de criação. Aproximou-se vagarosamente do indivíduo e, surpreendendo-o ao tentar pular o muro com seus amados patos, disse-lhe: Oh, bucéfalo anácrono! Não o interpelo pelo valor intrínseco dos bípedes palmípedes, mas sim pelo ato vil e sorrateiro de profanares o recôndito da minha habitação, levando meus ovíparos à sorrelfa e à socapa. Se fazes isso por necessidade, transijo; mas se é para zombares da minha elevada prosopopéia de cidadão digno e honrado, dar-te-ei com minha bengala fosfórica bem no alto da tua sinagoga, e o farei com tal ímpeto que te reduzirei à qüinquagésima potência que o vulgo denomina nada. E o ladrão, confuso, diz:
- 'Dotô, eu levo ou deixo os pato?'     (Rui Barbosa ).

E AINDA HÁ GENTE RECLAMANDO QUE O PORTUGUÊS É DIFICL HOJE KKKKKKK
BJS .

                                                  Eu sei, mas não devia


Marina Colasanti

Eu sei que a gente se acostuma. Mas não devia.

A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista, logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz. E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece a amplidão.
(1972)


A gente se acostuma a acordar de manhã sobressaltado porque está na hora. A tomar o café correndo porque está atrasado. A ler o jornal no ônibus porque não pode perder o tempo da viagem. A comer sanduíche porque não dá para almoçar. A sair do trabalho porque já é noite. A cochilar no ônibus porque está cansado. A deitar cedo e dormir pesado sem ter vivido o dia.

A gente se acostuma a abrir o jornal e a ler sobre a guerra. E, aceitando a guerra, aceita os mortos e que haja números para os mortos. E, aceitando os números, aceita não acreditar nas negociações de paz. E, não acreditando nas negociações de paz, aceita ler todo dia da guerra, dos números, da longa duração.

A gente se acostuma a esperar o dia inteiro e ouvir no telefone: hoje não posso ir. A sorrir para as pessoas sem receber um sorriso de volta. A ser ignorado quando precisava tanto ser visto.

A gente se acostuma a pagar por tudo o que deseja e o de que necessita. E a lutar para ganhar o dinheiro com que pagar. E a ganhar menos do que precisa. E a fazer fila para pagar. E a pagar mais do que as coisas valem. E a saber que cada vez pagar mais. E a procurar mais trabalho, para ganhar mais dinheiro, para ter com que pagar nas filas em que se cobra.

A gente se acostuma a andar na rua e ver cartazes. A abrir as revistas e ver anúncios. A ligar a televisão e assistir a comerciais. A ir ao cinema e engolir publicidade. A ser instigado, conduzido, desnorteado, lançado na infindável catarata dos produtos.

A gente se acostuma à poluição. Às salas fechadas de ar condicionado e cheiro de cigarro. À luz artificial de ligeiro tremor. Ao choque que os olhos levam na luz natural. Às bactérias da água potável. À contaminação da água do mar. À lenta morte dos rios. Se acostuma a não ouvir passarinho, a não ter galo de madrugada, a temer a hidrofobia dos cães, a não colher fruta no pé, a não ter sequer uma planta.

A gente se acostuma a coisas demais, para não sofrer. Em doses pequenas, tentando não perceber, vai afastando uma dor aqui, um ressentimento ali, uma revolta acolá. Se o cinema está cheio, a gente senta na primeira fila e torce um pouco o pescoço. Se a praia está contaminada, a gente molha só os pés e sua no resto do corpo. Se o trabalho está duro, a gente se consola pensando no fim de semana. E se no fim de semana não há muito o que fazer a gente vai dormir cedo e ainda fica satisfeito porque tem sempre sono atrasado.

A gente se acostuma para não se ralar na aspereza, para preservar a pele. Se acostuma para evitar feridas, sangramentos, para esquivar-se de faca e baioneta, para poupar o peito. A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que, gasta de tanto acostumar, se perde de si mesma.

Marina Colasanti
nasceu em Asmara, Etiópia, morou 11 anos na Itália e desde então vive no Brasil. Publicou vários livros de contos, crônicas, poemas e histórias infantis. Recebeu o Prêmio Jabuti com Eu sei mas não devia e também por Rota de Colisão. Dentre outros escreveu E por falar em Amor; Contos de Amor Rasgados; Aqui entre nós, Intimidade Pública, Eu Sozinha, Zooilógico, A Morada do Ser, A nova Mulher, Mulher daqui pra Frente e O leopardo é um animal delicado. Escreve, também, para revistas femininas e constantemente é convidada para cursos e palestras em todo o Brasil. É casada com o escritor e poeta Affonso Romano de Sant'Anna.

O texto acima foi extraído do livro "Eu sei, mas não devia", Editora Rocco - Rio de Janeiro, 1996, pág. 09.

              Leitura: quem começa não para mais...


Jornal Mundo Jovem  Entrevistapublicada na edição nº 394, março de 2009.Há muitos anos o jornal Mundo Jovem divulga o bordão “Ler é uma atitude inteligente”, uma ideia que se confirma nesta entrevista.
Elisabeth D’angelo Serra, fala da leitura como companhia na formação e como instrumento de acesso à cidadania, mesmo em tempos de novas tecnologias e advento da internet.
Elisabeth Dangelo Serra,secretária geral da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil.
Endereço eletrônico: fnlij@fnlij.org.br    Site: www.fnlij.org.br

Mundo Jovem: Qual a importância da leitura para os jovens?

Elisabeth Dangelo Serra: A leitura no mundo moderno é a habilidade intelectual mais importante a ser desenvolvida e cultivada por qualquer pessoa e de qualquer idade. Os jovens que não tiveram a oportunidade de descobrir os encantos e os poderes da leitura terão mais dificuldades para realizar seus projetos de vida do que aqueles que escolheram a leitura como companhia. Apesar dos atrativos atuais trazidos pelas novas tecnologias, hoje há um número expressivo de jovens que leem porque gostam e ao mesmo tempo são usuários da internet.

Aqueles que são leitores têm muito mais chances de usufruir da internet do que aqueles que não têm contato com a leitura de livros, jornais e revistas. Contudo é a leitura literária que alimenta a imaginação, a fantasia, criando as condições necessárias para pensar um projeto de vida com mais conhecimento sobre o mundo, sobre as coisas e sobre si mesmo. Uma mensagem: nunca é tarde para começar a ler literatura. Portanto aqueles que não trilharam esse caminho e desejarem experimentar, vale a pena tentar.

Mundo Jovem: Índices apontam que a leitura cresce no Brasil, mas no senso comum há o sentimento que não...

Elisabeth Dangelo Serra: O acesso aos livros aumentou, principalmente nos últimos 15 anos. Os programas dos governos de compra de livros de literatura para as escolas do Ensino Fundamental mudaram o cenário de 20 anos atrás. Hoje, a quase totalidade das escolas públicas brasileiras tem um acervo de livros de literatura de qualidade para uso de seus professores e alunos.

Mas, para que essa conquista resulte efetivamente em mais leitores, tem que estar integrada com outras ações dos governos e da sociedade em que a leitura seja considerada um bem cultural desejado e valioso. Quero dizer com isto que, por exemplo, a formação dos professores do Ensino Fundamental e Médio deve ter o seu eixo principal na leitura e na escrita. Somente com professores que sejam leitores será possível exigir dos alunos que eles leiam, interpretem e escrevam com fluência.

Mundo Jovem: Como nos tornamos leitores, como desenvolvemos o gosto pela leitura?


Elisabeth Dangelo Serra: Só há uma maneira de nos tornarmos leitores: lendo. E essa atitude é cultural, ela não nasce conosco, tem que ser desenvolvida e sempre alimentada. O entorno cultural em que a pessoa vive é determinante para que a habilidade de ler tenha chances de crescer. Ela é fruto do exemplo e das oportunidades de contato com a cultura letrada, em suas diversas formas. O exemplo e as oportunidades são criados por adultos que estão próximos às crianças e aos jovens.


Cabe aos professores brasileiros uma carga muito pesada, já que a maioria das famílias não tem chances de comprar livros, jornais diários e revistas semanais, dificultando o acesso ao texto escrito nas casas. Para que os professores possam desempenhar essa função, as escolas devem oferecer as condições para eles agirem de maneira a suprir essa falta, o que significa oferecer meios para uma formação continuada, ter bibliotecas com livros novos e variados e um projeto pedagógico em que o convívio com os livros e a leitura esteja no centro dos trabalhos e dos interesses de todos.

Mundo Jovem: Há exemplos de projetos eficazes de leitura que acontecem no Brasil?

Elisabeth Dangelo Serra: Inspirada no exemplo do International Board on Books for Young People (IBBY), a Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ) criou, em 1994, o primeiro concurso para os melhores programas de incentivo à leitura. Estamos já na 13ª edição do concurso que serviu de base para o Prêmio Viva Leitura. Os vencedores desses concursos são projetos com perfis diferentes (escolas, bibliotecas e sociedade civil) e mostram experiências em que os livros e a literatura são o centro do trabalho e apresentam como resultados o interesse por livros e o desempenho dos alunos e dos que frequentam ambientes de leitura.


Para que pudéssemos medir a eficácia desses projetos, seria necessário saber o que ocorreu com eles depois de alguns anos. Juntamente com o Instituto Ecofuturo, estamos trabalhando no sentido de avaliar o trabalho que realizamos em bibliotecas comunitárias implantadas pelo instituto, por meio de especialistas. O fruto dessa investigação visa a criar indicadores de leitura que poderão medir a eficácia dos pro etos de leitura. Porém, pela maneira tradicional, sabemos que os alunos com bom desempenho em leitura e escrita são aqueles que melhor se posicionam nos exames escolares. E isso não mudou.


Mundo Jovem: Qual a realidade e quais os desafios colocados para as bibliotecas escolares e comunitárias.


Elisabeth Dangelo Serra: Ao tomarmos como referência a situação dos sistemas de bibliotecas escolares, públicas e mesmo comunitárias em países desenvolvidos, a realidade de nossas bibliotecas é desanimadora. Os esforços de alguns bibliotecários e professores para mudar esse quadro vêm de anos e anos sem que na prática algo de essencial tenha mudado o cenário da política de acesso aos livros por meio da biblioteca.

Houve um momento em que algumas experiências com bibliotecas escolares e públicas tiveram sucesso em alguns estados, mas, como não temos o hábito de aprender com a história, elas ficam esquecidas. Não há, ainda, em nosso país, uma valorização do uso coletivo de livros como a maneira de se partilhar acervos para que todos possam usufruir dos mesmos livros. Portanto não há uma política pública que, de fato, esteja interessada em oferecer Bibliotecas, com B maiúsculo, para todos.

Mundo Jovem: Que projetos a escola pode implantar para garantir a promoção da leitura?

Elisabeth Dangelo Serra: A escola deve iniciar o projeto pela criação de uma biblioteca, por menor que seja, abri-la todos os dias e todos os horários e orientar os professores para que a usem como fonte de referência para seus planejamentos e para suas leituras, além de ser local de visita livre, e também obrigatória, por parte dos alunos.

O projeto pode contemplar grupos de leitura livre para os professores e grupos de estudo na biblioteca. Ela deve estar aberta às famílias que deverão ser convidadas a participar de suas atividades e mesmo contribuir, como voluntárias, para a sua organização. As feiras de livros e os encontros com escritores serão eficientes se a leitura fizer parte central do projeto da escola e a biblioteca for o seu coração de onde emanam as ideias, os questionamentos e os projetos e também o lugar para simplesmente desfrutar a leitura.


Mundo Jovem: Como a literatura impressa está convivendo com o advento da internet e das novas tecnologias?

Elisabeth Dangelo Serra: Acho que nunca houve tanto livro de ficção impresso como agora. Como é natural, há coisas com qualidade e outras não. A internet tem possibilitado a divulgação imediata do que está sendo publicado e facilita o acesso ao que já existe. O futuro, como sempre, é um exercício de ficção. Sou do grupo que acha que as novas tecnologias não tiraram, nem vão tirar, o prazer de ler um livro de literatura. Pode ser uma certeza das gerações que tiveram o livro como principal referência cultural, mas não sou radical.

Se alguém sentir a mesma emoção ao ler um texto literário na tela do computador que uma pessoa sente lendo no livro, e se isto possibilitar que ambos pensem sobre o que leram e possam trocar suas opiniões, sentimentos e ideias é o que importa. Essa é a função integradora da literatura. A escrita literária faz-nos olhar as palavras de maneira única e especial, e mobiliza-nos para, ao mesmo tempo em que nos deliciamos com elas - as palavras -, possamos viver uma história que nos leva a entrar pela página adentr , ou pela tela, levados pelo fascínio dessa construção artística que poucos dominam. Ler um texto literário é uma experiência única e intransferível cujas impressões e reflexões ganham novas interpretações quando podem ser compartilhadas.

Mundo Jovem: Quais livros seriam importantes que os jovens lessem no Brasil?

Elisabeth Dangelo Serra: Os livros que qualquer jovem de qualquer parte do mundo não podem deixar de ler são os clássicos universais e os de seus países e, assim, conhecer a história do pensamento e o patrimônio universal da humanidade. Devem procurar conhecer também o que há de novo e aqueles que ganharam prêmios. Para isso, é bom ler os suplementos literários, visitar as livrarias e ver os livros que mais despertam a curiosidade, sem nenhuma regra ou orientação. A construção do leitor passa por ler coisas sem qualidade também. Ouvir as sugestões de professores, pais e amigos é mais um caminho. No site da FNLIJ (
www.fnlij.org.br) está a lista dos livros premiados, desde 1974, por categoria: jovem, tradução jovem, informativo, poesia e teatro... Enfim, cada um deve ir construindo o seu próprio acervo de livros.

Mundo Jovem: Todo bom professor é um bom leitor?

Elisabeth Dangelo Serra: Eu acredito firmemente que todo bom professor é um bom leitor e vice-versa. Considero um bom leitor aquele que tem na literatura o seu alicerce principal que é o que abre as portas e consolida, embora não termine nunca, a condição de ser leitor. Formar professores leitores é dar condições para que eles tomem a leitura literária como parte das suas vidas. Sem desfrutar dessa leitura, dificilmente o professor contribuirá para que seus alunos sejam leitores.



A leitura começa em casa

A família é decisiva para incentivar a leitura. Além do exercício intelectual partilhado, a leitura entre pais, filhos, irmãos, tios e avós agrega o componente afetivo de maneira muito forte, fortalecendo o ato de ler. Ler junto é dar afeto também.

Nas famílias com poder aquisitivo para comprar livros e que já estejam motivadas para ler com seus filhos e conversar com eles sobre os livros, essa tarefa é mais fácil. Eles sabem o quanto esse ato é importante para a educação dos filhos e para fortalecer os laços de amizade na família. Difícil é para as famílias mais pobres que não podem comprar livros e que muitas vezes não são elas mesmas leitoras. Nesses casos, temos conhecimento de ocorrências no sentido inverso que são emocionantes.
Os filhos de pais analfabetos levam a leitura para seus pais que, orgulhosos e curiosos, partilham o ato de ler como um bem precioso. Mesmo sem serem leitores, eles sabem que isso vai proporcionar uma vida melhor do que a que tiveram para seus filhos.
O analfabeto percebe, melhor do que ninguém, o que é estar alijado do mundo à sua volta por não saber ler e interpretar com independência. Por isso, ele quer para seus filhos a condição de letrados. É obrigação de todos nós, que temos o privilégio de sermos leitores, enfrentar os entraves criados por uma sociedade brasileira elitista e conservadora para que todos tenham a oportunidade de trilhar o caminho da leitura e decidir, por eles mesmos, se querem continuar nele ou não. Essa é uma decisão pessoal de cada um desde que as condições sejam dadas e garantidas pelos governos com bibliotecas escolares, públicas e professores e bibliotecários formadores de leitores.


" O Benefício da Leitura"

                      Cérebro processa realidade e ficção literária de forma parecida

Durante a leitura, áreas cerebrais ativadas são as mesmas das tarefas cotidianas

Um estudo norte-americano identificou que o cérebro processa histórias da literatura de forma semelhante ao modo como armazena acontecimentos reais. Segundo o estudo, quando lemos um livro simulamos mentalmente as situações no decorrer da leitura baseados no que já vivenciamos. Por esse motivo, há a impressão de que estamos “dentro” da obra.

Baseado em estudos anteriores sobre o assunto, os pesquisadores da Universidade de Washington (EUA), decidiram monitorar as ações do cérebro durante a leitura de histórias buscando um ângulo diferenciado dessa vez. Um deles associou palavras às regiões específicas do cérebro. A leitura da palavra “andar”, por exemplo, ativa a mesma região do cérebro que o movimento real de andar.

Os testes foram feitos com os participantes do estudo, ao todo 28, que fizeram leituras de quatro histórias simples retiradas do livro “One Boys Day”, livro desenvolvido por psicólogos especialmente para estudos relacionados a esse assunto. Durante a avaliação, palavras por palavras foram mostradas aos participantes do estudo em uma tela de computador.

No decorrer dos testes, diversas regiões do cérebro foram ativadas e, dessa forma, rastrearam aspectos particulares da história considerados importantes para que fosse compreendida. Segundo os pesquisadores, quando ocorrem, por exemplo, mudanças na posição de objetos durante a história, regiões diferentes do cérebro rastreiam pontos importantes para que seja possível entendê-la e grande parte dessas regiões são as mesmas ativadas quando as pessoas realizam ações normais do dia a dia.

“Os livros também podem ajudar na educação, porque recuperam as brincadeiras para ensinar, prendendo a atenção da criança por um longo período”, afirma a psicóloga Fernanda Grimberg, da Clínica Luisa Catoira.
Principais benefícios da leitura:
• Aquisição de conhecimento : com a leitura, ampliamos nosso conhecimento sobre assuntos específicos e gerais.
• Estímulo à brincadeira : a leitura ajuda-nos a relaxar, levando-nos ao mundo do faz-de-conta, onde podemos projetar nossas emoções sem nenhum risco.
• Estímulo à criatividade: a leitura mexe com a nossa imaginação, estimulando-nos a desenvolver prazerosamente nosso potencial criativo.
• Desenvolvimento da capacidade de argumentar : a leitura estimula-nos a desenvolver argumentos consistentes e bem fundamentados.
• Ampliação do vocabulário : com a leitura, conhecemos novas palavras e aprendemos a usá-las em seus diferentes e ricos sentidos.
• Incentivo à reflexão e à formação de opinião : a leitura nos incentiva a pensar, a refletir, a formar uma opinião, a pôr em xeque nossas convicções e a chegar a uma conclusão.
• Ampliação do campo de visão : a leitura nos permite "ver" um assunto sob outras perspectivas, o que estimula nossa capacidade de aceitar o novo e o diferente.
• Confrontação de pontos de vista : a leitura nos leva a uma conversa com o autor, o que nos permite reforçar, esclarecer ou mudar nossos pontos de vista.
• Utilização dos recursos da linguagem : a leitura nos permite aprender, com os bons autores, a utilizar, inventivamente, os recursos oferecidos pela linguagem.
• Correção gramatical : com a leitura, aprendemos a escrever bem, de forma correta, pela observação, ou seja, naturalmente, sem esforço.
• Estímulo ao pensamento abstrato : a leitura nos permite perceber a realidade pelo ângulo da fantasia, o que amplia nossa capacidade de pensar sobre o abstrato.
• Estímulo à imaginação : quando lemos, vemos apenas palavras, mas logo formamos cenas na nossa tela mental, o que é muito estimulante para a imaginação.

Tutora : Amirleni  ( Gestar II)

Nova Alvoarada do Sul _MS

Apostando na leitura








Apostando na leitura
 

Se a chamada leitura do mundo se aprende por aí, na tal escola da vida, a leitura de livros carece de aprendizado mais  regular, que geralmente acontece na escola. Mas leitura, quer do mundo, quer de livros, só se aprende e se vivencia, de forma plena, coletivamente, em troca contínua de experiências com os outros. É nesse intercâmbio de leituras que se refinam, se reajustam e se redimensionam hipóteses de significado, ampliando constantemente a nossa compreensão dos outros, do mundo e de nós mesmos. Da proibição de certos livros (cuja posse poderia ser punida com a fogueira) ao prestígio da Bíblia, sobre a qual juram as testemunhas em júris de filmes norte-americanos, o livro, símbolo da leitura, ocupa lugar importante em nossa sociedade.
Foi o texto escrito, mais que o desenho, a oralidade ou o gesto, que o mundo ocidental elegeu como linguagem que cimenta a cidadania, a sensibilidade, o imaginário. É ao texto escrito que se confiam as produções de ponta da ciência e da filosofia; é ele que regula os direitos de um cidadão para com os . outros, de todos para com o Estado e vice-versa. Pois a cidadania plena, em sociedades como a nossa, só é possível — se e quando ela é possível — para leitores. Por isso, a escola é direito de todos e dever do Estado: uma escola competente, como precisam ser os leitores que ela precisa formar. Daí, talvez, o susto com que se observa qualquer declínio na prática de leitura, principalmente dos jovens, observação imediatamente transformada em diagnóstico de uma crise da leitura, geralmente encarada como anúncio do apocalipse, da derrocada da cultura e da civilização. Que os jovens não gostem de ler, que lêem mal ou lêem pouco é um refrão antigo, que de salas de professores e congressos de educação ressoa pelo país afora. Em tempo de vestibular, o susto é transportado para a imprensa e, ao começo de cada ano letivo, a terapêutica parece chegar à escola, na oferta de coleções de livros infantis, juvenis e paradidáticos, que apregoam vender, com a história que contam, o gosto pela leitura. Talvez, assim, pacifique corações saber  que desde sempre — isto é, desde que se inventaram livros e alunos — se reclama da leitura dos jovens, do declínio do bom gosto, da bancarrota das belas letras! Basta dizer que Quintiliano, mestre-escola romano, acrescentou a seu livro uma pequena antologia de textos literários, para garantir um mínimo de leitura aos estudantes de retórica. No século I da era cristã! Estamos, portanto, em boa companhia. E temos, de troco, uma boa sugestão: se cada leitor preocupado com a leitura do próximo, sobretudo leitores-professores, montar sua própria biblioteca e sua antologia e contagiar por elas outros leitores, sobretudo leitores-alunos, por certo a prática de leitura na comunidade representada por tal  círculo de pessoas terá um sentido mais vivo. E a vida será melhor, iluminada pela leitura solidária de histórias, de contos, de poemas, de romances, de crônicas e do que mais falar a nossos corações de leitores que, em tarefa de amor e paciência, apostam no aprendizado social da leitura.

Marisa Lajolo. Folha de S. Paulo, 19/9/1993 (com adaptações).
  Tutora :Amirleni da Cunha
  Nova Alvorada do Sul _MS

 

 

Chega um tempo em que não se diz mais: meu Deus.
Tempo de absoluta depuração.
Tempo em que não se diz mais: meu amor.
Porque o amor resultou inútil.
E os olhos não choram.
E as mãos tecem apenas o rude trabalho.
E o coração está seco.

Em vão mulheres batem à porta, não abrirás.
Ficaste sozinho, a luz apagou-se,
mas na sombra teus olhos resplandecem enormes.
És todo certeza, já não sabes sofrer.
E nada esperas de teus amigos.

Pouco importa venha velhice, que é a velhice?
Teus ombros suportam o mundo
e ele não pesa mais que a mão de uma criança.
As guerras, as fomes, as discussões dentro dos edifícios
provam apenas que a vida prossegue
e nem todos se libertaram ainda.
Alguns, achando bárbaro o espetáculo,
prefeririam (os delicados) morrer.
Chegou um tempo em que não adianta morrer.
Chegou um tempo em que a vida é uma ordem.
A vida apenas, sem mistificação
 
Tutora :Amirleni(Gestar II)
Nova Alvorada do sul -MS
 
 

                                                           Mundo Grande



Mundo grande
Não, meu coração não é maior que o mundo.
É muito menor.
Nele não cabem nem as minhas dores.
Por isso gosto tanto de me contar.
Por isso me dispo,
por isso me grito,
por isso frequento os jornais, me exponho cruamente nas livrarias:
preciso de todos.

Sim, meu coração é muito pequeno.
Só agora vejo que nele não cabem os homens.
Os homens estão cá fora, estão na rua.
A rua é enorme. Maior, muito maior do que eu esperava.
Mas também a rua não cabe todos os homens.
A rua é menor que o mundo.
O mundo é grande.

Tu sabes como é grande o mundo.
Conheces os navios que levam petróleo e livros, carne e algodão.
Viste as diferentes cores dos homens,
as diferentes dores dos homens,
sabes como é difícil sofrer tudo isso, amontoar tudo isso
num só peito de homem... sem que ele estale.

Fecha os olhos e esquece.
Escuta a água nos vidros,
tão calma, não anuncia nada.
Entretanto escorre nas mãos,
tão calma! Vai inundando tudo...
Renascerão as cidades submersas?
Os homens submersos – voltarão?

Meu coração não sabe.
Estúpido, ridículo e frágil é meu coração.
Só agora descubro
como é triste ignorar certas coisas.
(Na solidão de indivíduo
desaprendi a linguagem
com que homens se comunicam.)

Outrora escutei os anjos,
as sonatas, os poemas, as confissões patéticas.
Nunca escutei voz de gente.
Em verdade sou muito pobre.

Outrora viajei
países imaginários, fáceis de habitar,
ilhas sem problemas, não obstante exaustivas e convocando ao suicídio.

Meus amigos foram às ilhas.
Ilhas perdem o homem.
Entretanto alguns se salvaram e
trouxeram a notícia
de que o mundo, o grande mundo está crescendo todos os dias,
entre o fogo e o amor.

Então, meu coração também pode crescer.
Entre o amor e o fogo,
entre a vida e o fogo,
meu coração cresce dez metros e explode.
– Ó vida futura! Nós te criaremos.



Carlos Drummond de Andrade
 
Tutora : Amirleni (Gestar II )
 Nova Alvorada do Sul - MS.